MARCHA CONTRA CORRUPÇÃO DE 07 DE SETEMBRO DE 2012
SOURCE/LINK: http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/politica-cia/eliana-calmon-em-entrevista-no-mensalao-o-judiciario-tambem-esta-sendo-julgado/
às 16:47
\ Política & Cia
Ministra
Eliana Calmon (Foto: GF fotografias)
Entrevista
de Rodrigo Rangel publicada em edição impressa de VEJA
que está nas bancas
A JUSTIÇA
DEPOIS DO MENSALÃO
A
ministra deixa a Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça certa de que a
condenação dos mensaleiros vai levar à tolerância zero com a corrupção nos
tribunais brasileiros
Eliana
Calmon é capaz de ficar horas e horas falando sobre culinária. Sua especialidade
mais admirada, porém, é outra. Há dois anos, ela assumiu o cargo de corregedora
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) prometendo combater com rigor os
desmandos dos juízes. Não era promessa de político. Antes disso, já tinha se
envolvido em sonoras brigas no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao denunciar
que alguns de seus colegas faziam conchavos para interferir na escolha dos
novos integrantes da corte e, assim, influir em suas futuras decisões.
No CNJ, a
ministra apontou a existência de “bandidos escondidos atrás de togas”,
generalização que atraiu sobre ela a ira da categoria. Sob seu comando foi
aberto um número recorde de processos para apurar a conduta irregular de
juízes. Na semana passada, antes de deixar o cargo de corregedora e voltar ao STJ,
a ministra fez a VEJA um balanço de sua gestão.
O
julgamento do mensalão terá algum impacto sobre a Justiça brasileira como um
todo?
Esse é um
julgamento de importância fundamental para o Brasil, porque toda a nação está
examinando como se comportará o Poder Judiciário. O Judiciário também está
sendo julgado. Esse julgamento vai refletir o que é a Justiça brasileira. Os
ministros podem condenar ou absolver, mas terão de mostrar com clareza por que
estão condenando ou absolvendo. Isso está sendo feito.
O rigor
que os ministros do Supremo têm demonstrado com relação à corrupção reflete uma
mudança de parâmetros?
O Supremo
faz com que a magistratura se enquadre num novo modelo. Toda carreira — e a
magistratura em especial vive de lição e exemplo. Temos de ser exemplo para as
pessoas que estão abaixo de nós. No momento em que o Supremo ensina a lição e
dá exemplo, vira referencial.
O juiz de
comarca passa a ter referência, admiração, e passa a trabalhar para se igualar
àqueles que ele admira no topo da hierarquia. Quando o Supremo faz um
julgamento técnico, sério e até rápido, com votos compreensivos, como tem sido
neste caso, isso transmite credibilidade ao povo brasileiro.
O Supremo
está dizendo que a corrupção, que durante dois séculos reinou neste país, a
partir de agora tem um freio, e esse freio está no Poder Judiciário. Não haverá
mais tolerância com a corrupção. Não tenho dúvida de que isso já está
provocando mudanças nos planos de certos bandidos, inclusive os de toga.
Por que
essa atitude mais proativa em defesa do bem público demorou tanto a chegar ao
Poder Judiciário?
A Justiça
não se apercebeu das mudanças que a Constituição trouxe. Na medida em que o
Judiciário não tem consciência de seu papel, vira o chancelador do que os
outros poderes decidem. O Judiciário demorou a perceber que tem poder próprio e
não deve funcionar como extensão dos outros poderes.
A senhora
deixa o Conselho Nacional de Justiça mais assustada ou mais aliviada?
Conheci
as entranhas do Poder Judiciário e pensei que a situação estivesse melhor. Na
Corregedoria, eu vi a Justiça em uma situação muito negativa. A gestão, por
exemplo, ainda é muito ruim. Mas saio aliviada porque me aproximei muito dos
tribunais, que perceberam que com boa gestão é possível melhorar.
Não digo
que fiz um saneamento, mas fiz parceria com os presidentes dos tribunais. São
Paulo é um exemplo que me deixa maravilhada. Era um tribunal fechado, que nunca
aceitou o CNJ, mas no fim conseguimos avançar. É preciso eliminar de vez o
patrimonialismo e o compadrio. Alguns tribunais até hoje fazem favores ao
governador, e o governador arruma emprego para parentes de juízes.
A senhora
gerou uma crise sem precedentes no Judiciário quando disse que há bandidos
escondidos atrás de togas. Eles existem mesmo?
É claro
que há bandidos de toga. É só olhar o número de juízes afastados por
improbidade, olhar o número de investigações instauradas nos últimos tempos. Os
números são grandes. Olhe que a Corregedoria do CNJ tem uma estrutura pequena
para tantos problemas, e não temos condições de descobrir tudo.
Aquilo
que eu falei, e não foi generalizando, falei numa linguagem forte para mostrar
que muitas vezes as pessoas querem se esconder atrás da toga porque buscam a
proteção que o cargo dá. Na verdade, eu acabei sendo intérprete da consciência
coletiva.
"O
Judiciário sempre foi conivente com os outros poderes, sempre foi um
chancelador do que os outros poderes decidiam. Até hoje há juízes que comungam
da ideia de que é preciso ser amigo do rei" (Foto: ABr)
Qual foi
a parte mais difícil do trabalho da senhora como corregedora?
A função
disciplinar é difícil porque há uma grande resistência por parte das
associações de juízes. O corporativismo é forte. Ainda pensam que, se acharmos
corrupção, temos de resolver a questão internamente, sem levá-la ao
conhecimento da sociedade. Eu penso diferente.
Nós
temos, sim, de levar as mazelas do Judiciário ao conhecimento da sociedade. Uma
das punições é justamente essa. Até porque a legislação que trata de punições a
juízes é muito antiga. Por ela, a punição máxima para um desembargador é a
aposentadoria. Se não for uma falta gravíssima, ele ficará sem punição. Daí eu
acho que uma das penas mais temidas é a divulgação daquilo que for constatado.
Qual é o
perfil desses “bandidos de toga” a que a senhora se refere?
Obviamente
não estou afirmando que todos os juízes que dizem só falar nos autos são
bandidos, mas o criminoso de toga tende a ser um juiz hermético, formalista,
que fala pouco e não recebe as partes. Mas ele está apenas se escondendo atrás
do formalismo. Essa atitude o beneficia. O objetivo dele é fazer da Justiça um
balcão de negócios. Ele sabe quais processos podem render dinheiro. Existem
alguns nichos preferenciais, como os processos por dano moral.
Por quê?
Porque o
dano moral não é mensurável pela lei. Os bancos também são vítimas frequentes.
Os juízes dão decisões, impõem multas estratosféricas e mandam depositar o
dinheiro imediatamente. Muitas vezes o juiz se associa ao advogado e divide os
lucros. É claro que, em um universo de 16000 juízes, nem 2% fazem isso, mas o
estrago para a carreira é muito grande. Essa é a pior face da magistratura.
A senhora
fala muito da “intimidade indecente” entre o Judiciário e a política. Por que
ela teima em existir?
Isso vem
de dois séculos. O Judiciário sempre foi conivente com os outros poderes,
sempre foi um chancelador do que os outros poderes decidiam. Até hoje há juízes
que comungam da ideia de que é preciso ser amigo do rei.
O modelo
de nomeação de juízes de tribunais superiores, que são escolhidos politicamente
por decisão do presidente da República, contribui para essa relação?
Esse é o
caminho. Em todos os países, quem escolhe os ministros da Suprema Corte é o
presidente da República. Pensei muito nisso, inclusive quando passei por esse
processo para chegar ao STJ. É doloroso para um juiz de carreira enfrentar um
processo tão político. Você aprende que um magistrado deve ficar afastado da
política, não deve se imiscuir na política, mas na hora H tem de passar a cuia
entre os políticos pedindo o favor da indicação.
Existe
uma maneira de quebrar essa situação de dependência do Judiciário em relação
aos políticos?
Do ponto
de vista formal, o processo de escolha de ministros de tribunais superiores é
perfeito. O indicado é escolhido pelo presidente da República e submetido ao
Senado, que o sabatina para ver se tem notável saber jurídico. Tudo isso é
público e as pessoas podem avaliar se o indicado tem os requisitos necessários
para o cargo. Tudo perfeito. Mas só na teoria.
Na
prática é diferente. Falta responsabilidade. Dentro do Judiciário, no qual se
diz que não existe política, há a política miúda dos grupelhos que se acertam
para escolher quem vai compor as listas de indicados. O Executivo escolhe de
acordo com os apoios políticos, ou seja, os padrinhos.
Por sua
vez, o Legislativo, que deveria analisar o saber jurídico e a reputação ilibada
do indicado, não faz o que deve. Antes da sabatina, o indicado visita os
gabinetes dos senadores para amortecer intervenções que não sejam do seu
agrado. A sabatina vira apenas uma formalidade.
A senhora
também teve padrinhos?
Lógico.
Todo mundo busca apoio, só que ninguém diz. Eu tive como padrinhos os senadores
Antonio Carlos Magalhães, Renan Calheiros, Jader Barbalho e Edison Lobão.
Amigos me levaram até eles, e eles se tomaram meus padrinhos.
Esse
apadrinhamento não é cobrado depois, na forma de algum favor?
Imagino
que sim. A mim nunca fizeram pedido, porque quando cheguei lá coloquei tudo às
claras, incluindo os nomes de quem me indicou. Quem vai pedir alguma coisa a
uma língua ferina como esta minha? Nós precisamos é de seriedade institucional.
Na hora
de escolher alguém para um cargo relevante, não se pode pensar em colocar o
amigo, alguém que vá fazer favor. Tem de ser o melhor possível, para fazer
justiça, para ser um bom ministro.
A senhora
foi acusada de abuso nas investigações de juízes especialmente quando começou a
apurar suspeitas de enriquecimento ilícito. A reação foi exagerada?
Eu tratei
as questões do Judiciário de forma muito incisiva e crua. E isso chocou um
pouco. É um poder muito fechado e corporativista, que se sentiu agredido. Mas
eu falei o que tinha de falar, e fiz isso para chocar mesmo, porque, se não
chocasse, não causaria o efeito que causei. Eu estava disposta a mudar, e
ninguém muda comodamente. A gente só muda quando choca.
"Não
vou me meter em política de maneira nenhuma" (Foto: Gilmar Félix / Agência
CNJ)
A
senhora prevê alguma hostilidade na sua volta ao Superior Tribunal de Justiça,
no qual comprou brigas?
Uma
dessas brigas foi criticar a atuação de filhos de ministros como advogados na
corte. Esse problema resiste no STJ. Antigamente os filhos de ministros viviam
como funcionários públicos. Quando nós combatemos o nepotismo e achamos que
tínhamos realizado uma grande coisa, combatemos um problema e o outro ficou.
Não se pode impedir que filhos de ministros advoguem.
O grande
problema é o fato de eles usarem seu nome para fazer cooptação de clientela.
Eles dizem ao cliente que têm influência no tribunal porque são filhos de
ministros. No meu gabinete, eles não têm vez nem para marcar audiência. Nem
filho de ministro nem ministro aposentado atuando, que é outra coisa imprópria
mas existe. O ministro se aposenta e vai fazer lobby no tribunal. Nós
precisamos acabar com essa prática, não dando chance de aproximação.
Por que
essa prática resiste, apesar de ser imprópria?
Muitas vezes
esses filhos de ministros não têm nem procuração nos autos. Eles não fazem
sustentação oral, não fazem nada, só acompanham outros advogados para facilitar
o acesso. Entram apenas para dar a impressão ao cliente de que realmente têm
chance de ganhar, não por ter o direito, mas por influência.
Em alguns
gabinetes, dizem que isso funciona. Vende-se a ideia de que filho de ministro
faz milagres. Faz milagres porque é mais inteligente? Não, é porque, se não der
jeito, vai fazer safadeza. É a advocacia de lobby, que não se sustenta pelas
razões jurídicas, mas pelas razões extrajurídicas, de amizade, de afeto, de
relacionamentos.
Qual é a
consequência mais visível desse tipo de situação?
Em
primeiro lugar, isso desacredita a Justiça. Além do mais, é uma absoluta
injustiça para com os advogados que são sérios, trabalhadores e vão à tribuna
defender o direito. A advocacia de lobby causa um mal enorme e precisa ser
banida, é um horror. É obrigatório acabar com isso. Cabe aos próprios ministros
coibir essa prática. Isso só depende de nós. Basta perguntar ao “advogado” que
chega ao gabinete se ele tem procuração nos autos. Se não tem, o ministro tem
de dizer: “O senhor ponha-se daqui para fora”.
Sua
visibilidade fez surgir rumores de que poderia sair candidata a algum cargo
político. Isso está nos seus planos?
Já me
convidaram para ser candidata a senadora pelo Distrito Federal, mas não vou me
meter em política de maneira nenhuma. Também não vou advogar. De dinheiro eu
não vou precisar, porque tenho uma vida modesta e a minha aposentadoria
certamente será suficiente. Penso em mais tarde, quem sabe, participar de uma
entidade de combate à corrupção ou me dedicar aos livros de culinária.
Tags: "advocacia
de lobby", "bandidos
de togas", Antônio
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Calheiros, reputação
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Corte, tolerância
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5 Comentários
- Lourival dos santos filho
-
12/09/2012 às 13:56
Ministra Eliana Calmon,como eu, e milhões de
brasileiros, gostaríamos de vê-la no STF.
- Lourival dos santos filho
-
12/09/2012 às 13:37
Ministra Eliana Calmon,como eu, e milhões de
brasileiros, gostaríamos de ve-la no STF.
- Elisabete Pereira
-
10/09/2012 às 21:45
Pessoas como a Ministra Eliana Calmon,me fazem
acreditar que eu não sou uma exceção por acreditar e lutar pela justiça
- Natal
-
10/09/2012 às 18:21
Ela deveria ir para o Supremo, já!
Defendi a tese há tempos, mas ela passou da idade mínima para chegar ao Supremo, que é de 65 anos de idade.
Defendi a tese há tempos, mas ela passou da idade mínima para chegar ao Supremo, que é de 65 anos de idade.
Abraço
- Reynaldo-BH
-
10/09/2012 às 17:42
Um detalhe (detalhe?) não deixa de ser
estarrecedor, embora sobejamente conhecido. A necessidade de padrinhos.
Que Eliana Calmon confessa, mesmo deixando claro que não se submeteria à ordens ou favores dos mesmos.
Que estranha lógica que Sarney, ACM, Renan e Lobão “fazem” ministros do STF! TODOS, sem exceção, mais para réus em ações do que conselheiros do Poder Judiciário. A maleabilidade necessária para ser indicado(a) e não manter vassalagem aos padrinhos, mancha definitivamente o processo de seleção. Deixamos nas mãos de cada indicado a ética e decência mais necessárias que o próprio saber jurídico. Ou no escopo moral de cada qual.
Que procedimento é este que fragiliza um poder frente a outros? Um indica; o outro faz lobby e o terceiro (que deveria ser o mais independente de todos!) aceita o Mise-en-Scène indecente.
Até quando vamos considerar o Poder Judiciário algo acessório na cidadania? Ou de menor importância?
É como os que aceitam as mazelas imorais do atendimento público à Saúde. Se esquecem que em um acidente (de qualquer ordem) será este atendimento que será prestado, pouco (ou nada) valendo os planos provados de Saúde.
O Judiciário está somente no campo de visão – de alguns – como aquele que condenará algum desvio cometido por quem assim deu causa. Não se enxerga a certeza da garantia legal da cidadania.
Eliana Calmon honrou a indicação e a atuação no STJ e CNJ.
Embora tenha sido apadrinhada pela escória política brasileira. Exceto ACM (que morreu antes de ser cooptado!) todos fiéis aliados do estado putrefato que se instalou em nome de um pensamento único.
Que atingiu até o Judiciário.
Que Eliana Calmon confessa, mesmo deixando claro que não se submeteria à ordens ou favores dos mesmos.
Que estranha lógica que Sarney, ACM, Renan e Lobão “fazem” ministros do STF! TODOS, sem exceção, mais para réus em ações do que conselheiros do Poder Judiciário. A maleabilidade necessária para ser indicado(a) e não manter vassalagem aos padrinhos, mancha definitivamente o processo de seleção. Deixamos nas mãos de cada indicado a ética e decência mais necessárias que o próprio saber jurídico. Ou no escopo moral de cada qual.
Que procedimento é este que fragiliza um poder frente a outros? Um indica; o outro faz lobby e o terceiro (que deveria ser o mais independente de todos!) aceita o Mise-en-Scène indecente.
Até quando vamos considerar o Poder Judiciário algo acessório na cidadania? Ou de menor importância?
É como os que aceitam as mazelas imorais do atendimento público à Saúde. Se esquecem que em um acidente (de qualquer ordem) será este atendimento que será prestado, pouco (ou nada) valendo os planos provados de Saúde.
O Judiciário está somente no campo de visão – de alguns – como aquele que condenará algum desvio cometido por quem assim deu causa. Não se enxerga a certeza da garantia legal da cidadania.
Eliana Calmon honrou a indicação e a atuação no STJ e CNJ.
Embora tenha sido apadrinhada pela escória política brasileira. Exceto ACM (que morreu antes de ser cooptado!) todos fiéis aliados do estado putrefato que se instalou em nome de um pensamento único.
Que atingiu até o Judiciário.
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